quinta-feira, dezembro 25, 2008

sexta-feira, novembro 28, 2008

Bobeou.... Passou!!

Férias é uma m..... droga!! Chega a aposentadoria, mas não chega o dia de levantar as pernas para cima. Quando começa, passa voando: piscou, dançou..... acabou!! Mas uma coisa que eu aprendi com a vida é que férias só tem gosto bom quando é precedida de uma boa jornada de trabalho. E olha que a minha foi grande, rs.

Encerro o período de descanso com a certeza de que valeu a pena. E como valeu. Não registrei quase nada aqui porque tenho uma filosofia: férias são férias, não dá para se preocupar em atualizar blog. Tenho, porém, vários projetos de futuras viagens, que não terão caráter de férias, e que terei o maior prazer em fazer relatos periódicos. Aliás, não sou especialista em Jornalismo Literário, como muito dos meus amigos, mas narrativas de viagens me fascinam muito.

Deixe-me ir. Vou trocar, agora, de dor nas costas: de ficar deitado pela de sentar na cadeira de um boteco, beber e papear.

quarta-feira, novembro 05, 2008

Particularidades

Bonito (MS) - Há alguma coisa neste Estado que me fascina. Algo que não encontro em Goiânia, ou em outra parte de Goiás. Acredito que seja, na verdade, um conjunto de fatores que se juntam e criam parte da cultura daqui.

Eu nasci e morei a maior parte da minha vida na capital do meu Estado, mas semprei me senti atraído por culturas externas. A proximidade que esta cidade tem de outros países é algo que me deixa impressionado. Seja na Bolívia, onde a linha de fronteira política também é cultural - um passo dentro do país vizinho e tudo muda - seja no Paraguai, onde você começa a conversar com as pessoas em portunhol e, quase sempre, testemunha comentários paralelos em Guarany, a língua indígena local.

O turismo internacionalmente conhecido de Bonito e do Pantanal também atrai muitas pessoas de fora. Estes são majoritariamente gringos (estadunidenses, europeus ou asiáticos). É só chegar em Campo Grande que você começa a ouvir pessoas de todos os lados tentando se comunicar em gringoglês (mistura de inglês e português). Estes, quase sempre, embarcam em um ônibus com destino a Corumbá.

Aqui também tem uma cultura rural muito maior que em Goiás. Olha que eu imaginei que isto não fosse possível. Enquanto a 'modernidade' já adentrou bastante nas terras goianas, por aqui as coisas ainda são muito ligadas a terra. Parece o meu Estado há algumas décadas.

Ah, sim, nem preciso falar que tudo aqui é longe. As principais cidades do Estado (Dourados, Campo Grande e Corumbá) ficam a 300km. Ou seja, em um raio de 300km não tem nada. Percorrer mais de 100km sem nenhuma cidade ou vila também é super comum por aqui. Costumo dizer que 40km de Goiás equivale a 120km de MS.

terça-feira, outubro 14, 2008

Antes e depois

Vou evitar inícios como: "Olha só, quanto tempo não posto aqui!". Na verdade a demora para escrever alguma coisa é bem planejada. Não tenho feito nada demais que mereça tal registro. Pensando bem, porém, qualquer coisa pode ser muito bem narrada e esmiuçada, por mais que seja um ato pequeno. Quer saber de uma coisa, deixa eu parar de filosofar que assim não vai dar certo.

As eleições já se passaram, e que venha 2010. Esta é a lógica do meu trabalho. Nada como ser jornalista político que vive na sombra dos pleitos eleitorais. Aliás, me faltam sinôminos para 'eleições'. Nos textos que escrevo, fico alternando entre eleições, pleito eleitoral, processo político e assim vai, para ver se consigo dar uma enganada. Mas no fim é tudo a mesma coisa, mesmo.

Como o tempo passa!! Parece mentira que outro dia eu estava me auto-flagelando porque faltavam longos seis meses para as minhas férias. Há três semanas do meu merecido descanso, não sei mais o que pensar. Espero que no meu período de ócio-criativo posso chegar às respostas que necessito. Se é que necessito de alguma. Enfim, que, no mínimo, possa dar uma boa descansada.

segunda-feira, setembro 01, 2008

De volta.... a Goiânia mesmo!!

Depois de um mês escrevendo todos os dias, e de dois sem falar de nada, acho que está na hora de tirar as teias de aranha. Estou aqui no trabalho sem muito o que fazer (dependendo dos outros, como todo trabalho jornalístico exige), e resolvi escrever algo.

Falando sobre viagens, há mais de cinco meses não saio da cidade para algum lugar longe e interessante, que valha a pena. Estou em contagem regressiva para férias. De hoje até lá são exatamente dois meses, o que me motiva a gerar fatos que possam estimular as folhinhas do calendário a caírem mais depressa.

E olha que elas andam caindo moderadamente rápidas. Me lembro muito bem quando eu estava arrancando os cabelos porque ainda faltavam sete meses para deixar o trabalho 30 dias de lado. Me dá sono só de pensar. Por isto espero curtir este dois meses pré-férias pois, como todo bom trabalhador já sabe, quando elas começam acabam rapidinhas, snif, snif.... E depois que elas se forem começarei um ritmo alucinante de trabalho, mas daí que não tem nada haver com jornalismo. Ou pelo menos quase nada.

Estou com saudades de escrever sobre futebol. Tenho acompanhado o Campeonato Brasileiro como nunca em minha vida. Pelo menos nos últimos anos. Esperava ter uma sequência lá no meu blog esportivo, mas não consegui. Acho que é melhor assim, escrever só quando dá vontade. Pelo menos enquanto há escolha.

domingo, junho 29, 2008

Chegada

Para mim a noite foi instantânea. Quando acordei, tive a certeza de ter dormido um sono maravilhoso e estava totalmente revigorado para, finalmente, ir de fato para a casa. Arrumamos as coisas rapidamente e saí para tirar dinheiro. A caminho do banco bateu um pequeno desespero, já que não tínhamos muito tempo de sobra e em Congonhas é sempre bom chegar o mais cedo possível. Assim, apertei o passo e voltei logo para tomar café da manhã.

O albergue chamou um táxi para nós e saímos rumo ao aeroporto. No caminho, o trânsito estava lento, em uma típica manhã de sexta-feira em São Paulo. Nesta hora notei que minha preocupação anterior tinha fundamento. No final, porém, chegamos com uma boa margem para fazer check-in e embarcarmos tranqüilamente.

Na fila do atendimento, uma atendente com um palm-top foi adiantando o meu check-in. Peguei a última poltrona de janela. Despachamos as bagagens e seguimos para o embarque. Depois que passamos pelo raio-X, deparamos com um salão lotado de passageiros. Estávamos em meio à crise aérea, o que nos deixou preocupado. Felizmente, o atraso foi pequeno, o que não deixou de ser um grande lucro devido à conjuntura do momento.

A vigem foi muito tranqüila. A cada minuto de vôo aumentava a expectativa de chegar em casa. O avião chegou pelo sul de Goiânia e sobrevoou toda a cidade pelo oeste até se aproximar do Aeroporto Santa Genoveva pelo norte. De cima vi o meu bairro, a maior parte dos pontos chaves da cidade, apreciei o Morro do Mendanha, observei o Campus da UFG e a GO para Nerópolis. Até parecia que o piloto estava fazendo um tour na cidade para nós matarmos a saudade após tantos dias fora.

Foi muito bom pisar em solo goiano outra vez. Havíamos chegado, graças a DEUS. Mal pude agüentar o tempo de espera para pegar a minha mala e sair de lá. A primeira pessoa familiar que encontramos foi a Erika, que nos deu uma carona até o centro, na casa do Rodrigo. De lá segui de táxi. A cada rua que passava uma nova emoção. Sentimento de quem saiu, viu tudo o que vimos, passou todos os ‘sufocos’, praticamente cruzou o continente sul-americano, e que agora estava em casa novamente. Ao descer do táxi e pegar as malas, vi a mesma fachada do prédio que havia me despedido 26 dias antes. O subir do elevador, o abrir da porta..... Pronto!! Estava em casa de novo.

Mapa do Caminho - Dia 26

Data: 29/06/2007
Saída: São Paulo (SP), Brasil
Chegada: Goiânia (GO), Brasil
Distância percorrida no dia: 960 km
Empresa aérea: Gol Linhas Aéreas
Duração da viagem: +- 1h30min
Tarifa: +- R$ 180,00

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Em tempo, agradeço a todos que acompanharam a minha nova jornada, este ano viajando por meio das palavras, e comunico que este blog ficará alguns dias de recesso depois de tantos caracteres escritos diariamente.

sábado, junho 28, 2008

De volta ao mundo lusofônico

Decolamos por volta de meia noite e meia do Aeropuerto Internacional Jorge Chávez. Estava nas primeiras fileiras de poltronas, do lado esquerdo, entre uma gringa, que parecia escandinava pela brancura da pele, e uma outra de nacionalidade desconhecida e que não tinha a mínima noção de espaço. Por estar no meio eu era o mais prejudicado, e esta mulher ainda queria estender suas pernas no pequeno local onde eu espremia as minhas.

A viagem tinha duração de quatro horas, mas como voltaríamos ao horário de Brasília (duas horas a mais do que o de Lima) chegaríamos a Buenos Aires pouco depois das seis e meia da manhã. Ou seja, nossa noite teria duas horas a menos. Só consegui dormir uma hora no avião, mesmo assim muito mal. Meu corpo doía todo naquele espaço minúsculo. Uma hora antes da decolagem, comecei a ter uma sede incontrolável. Chamei a aeromoça e ela me trouxe um ‘vaso de agua’, que se limitava a três dedos de água. Não deu nem para o começo.

Depois que passamos das seis da manhã, começou a dar desespero. Torcia para que a viagem estivesse no final. Tive que esperar mais quarenta minutos para começar a movimentação das aeromoças. Que alívio! O dia começou a amanhecer, mas não se via nada de fora da janela. Pensei que estávamos sobrevoando meio a uma nuvem, porque não dava a impressão de estarmos descendo. Quando a visão ficou limpa, porém, já estávamos a poucos metros da pista. Era neblina. Menos mal, pois havíamos chegado na fria Buenos Aires.

Quando desembarquei bateu um grande desânimo. Não tinha dinheiro para sair do aeroporto e usar as oito horas que tínhamos ali para conhecer a cidade, já que para voltar depois teria que pagar novamente a taxa de embarque. Somava-se ainda a fome, sede e sono. Tratei logo de solucionar os dois primeiros problemas. Como não achei uma casa de câmbio perto, fui a um restaurante próximo e usei cartão de crédito. Comi um lanche, bebi um refri e logo meu humor começou a melhorar.

A seguir fui conhecer o aeroporto. Descobri que a área internacional era mais do que o dobro do tamanho que eu imaginava. Muitas e muitas lojas, mas todas com um defeito em comum – preços bem caros. Perdi a conta de quantas voltas eu dei por lá. Acho que gastei o piso do aeroporto de tanto ir de um lado para o outro, para passar o tempo. Quando cansei, deitei-me nos bancos e tirei um cochilo.

Entre um cochilo e uma batida de pernas, o tempo foi passando. Logo estávamos na hora do almoço, mas preferi economizar e deixei para comer no avião. O nosso vôo saía as duas e meia da tarde e chegaria em São Paulo pouco depois das cinco horas. Desta vez não houve atrasos. Logo depois das duas, uma funcionária formou a fila e prosseguiu o embarque.

Desta vez a minha viagem só não foi pior porque o vôo não estava cheio. O lugar de janela ao meu lado não foi vendido. Essencial, já que quando fui sentar na minha poltrona, no meio outra vez, percebi que eu não cabia no espaço destinado. Os braços da poltrona meio que entortaram quando eu insisti. Pulei para a janela e fiquei torcendo para que ninguém aparecesse.

Apesar do cansaço a viagem foi muito legal. Logo na decolagem deu para ver o Rio da Prata e a costa uruguaia. Depois da comida, fiquei observando e, de longe, avistei Florianópolis. O avião ia acompanhando a costa brasileira em uma bonita tarde de sol. Desta vez foi o contrário, lamentava a medida que o vôo ia chegando ao final. Nos últimos quarenta minutos, conheci um menino boliviano que viajava no banco da frente e que voltava, com os seus pais, para Santa Cruz de la Sierra. Fiquei conversando com ele até o desembarque.

Foi uma das poucas vezes na minha vida que achei bom ser brasileiro. Assim que apontamos no corredor da imigração, vimos uma grande fila à esquerda. Não deu nem tempo para lamentar, já que ao lado havia uma placa informando: “Brasileiros à direita”. Ou seja, sem filas. Para fazer um teste, guardei o passaporte e mostrei a carteira de identidade para o oficial da Polícia Federal. Ele deu uma olhada rápida na frente e no verso e me deixou passar. Para agradecer acabei me enganando e soltei um “gracias”. Coisas que a gente faz depois de tantos dias longe do nosso país.

Já no lado de fora do Aeroporto de Guarulhos, precisávamos encontrar um meio de transporte para o centro de São Paulo. Por mim iria de ônibus e economizaria um dinheiro, já que minhas reservas financeiras estavam bem baixas. Porém, os outros quiseram dividir um táxi e acabei não querendo ser o ‘chato da história’. Como foi bom estar de volta em um táxi brasileiro, falando português, vendo as placas na rua em nosso idioma, estando novamente em uma cidade brasileira. Estava com saudades de tudo isto.

O taxista, porém, se complicou na hora de procurar o nosso hostel, no centro. Não sabia onde era a rua Barão de Campinas. Ligou um GPS, contatou a central, mas no final o que valeu mesmo foi a minha memória, já que sempre fico lá quando vou a São Paulo. Como só eu e o Rodrigo optamos por ficar no albergue, entramos e pedimos um quarto duplo. Já era noite nesta hora. Estava tão cansado que mal conseguia manter os olhos aberto. Fomos até a lanchonete do próprio hostel e comemos um cachorro quente. No quarto liguei a televisão, mas não agüentei ver um minuto de “A Grande Família”. Adormeci como uma pedra, e nada me acordou até a manhã seguinte.

Mapa do Caminho - Dia 25

Data: 28/06/2007
Saída: Buenos Aires, Argentina
Chegada: São Paulo, Brasil
Distância percorrida no dia: 2.375 km
Empresa aérea: Aerolineas Argentinas
Duração da viagem: +- 2h30min
Tarifa: +-R$ 720,00 (de Lima a São Paulo) + taxa de embarque (US$ 30,75)

sexta-feira, junho 27, 2008

Último dia no Peru

Finalmente chegou o dia de voltar ao lar. Estava muito ansioso e com uma vontade enorme de entrar na minha casa, comer a comida da minha mãe, dormir na minha cama, encontrar minha família e amigos, enfim, voltar. É nestas horas que você dá muito valor a sua rotina, mesmo sabendo que em dois ou três meses tudo fica chato novamente e, para se consolar, você passa a planejar novas jornadas. De jornada em jornada é que se enriquece a vida.

Acordei com o Rodrigo falando comigo para virar de lado na cama. Não entendi o porquê, mas atendi o seu pedido. Apenas mais tarde ele foi me explicar que eu estava roncando demais. Não escutei nada. O novo albergue estava aprovado. Dormi muito bem. Arrumamos parcialmente as coisas e saímos para dar uma última volta por Miraflores.

Não tínhamos nada o que fazer. Seguimos, então, a cartilha goiana do tempo livre e não pensamos duas vezes em nos mandar para o shopping. Larcomar, é claro. Chegamos lá, fomos almoçar, ou melhor, lanchar. Logo depois de comer, ocorreu um episódio que não posso deixar de relatar. Estava eu sentado em uma cadeira, próximo a um degrau. Como em uma comédia pastelão, empurrei sem querer a cadeira com as costas e tombei de costas. Para a minha sorte a mesa ao lado, com um casal peruano e uma criança, me segurou, mas o estrago já havia sido feito. O refrigerante deles caiu no chão. Sem graça, me ofereci para pagar o prejuízo, mas eles não aceitaram. Os outros riam tanto que fiquei sem graça e saí de perto.

Melhor do que me remoer de culpa é comer Donuts. Lá no Larcomar havia uma barraquinha filial do Dunkin´ Donuts, e toda hora que passava na frente comprava um. Para me perdoar, desta vez acabei comprando dois e fui ver os horários do cinema. Estava com muita vontade de assistir Shrek 2. Para você que está pensando que é um absurdo estar do outro lado do continente e fazer uma coisa que existe do lado de casa, deixe-me lembrar que há todo um aspecto cultural, já que o filme é traduzido em español (rs).

Na hora que fui comprar o ingresso, Lucimeire me convenceu a mudar os planos. Ao invés de ver o famoso ogro verde, fomos jogar boliche. Aí sim, uma coisa que já não tem mais em Goiânia, infelizmente. Já Rodrigo e Lorena não animaram a entrar no jogo e foram ao cinema assistir um outro filme que não me lembro. Fazia muito tempo que não jogava. O objetivo era jogar apenas uma partida, mas à medida que íamos melhorando, fomos estendendo. O preço não era caro, já que pagávamos em soles. Foram algumas horas muito divertidas, que fizeram com que eu me esquecesse que estava a 4.500 km de casa.

Lá para o meio da tarde, cansamos e saímos do shopping. Passamos em uma Lan House para dar uma olhada na Internet. Saindo de lá, a Lucimeire me convenceu, novamente, a ir até a praia. Não vou mentir que deu preguiça, mas acabei aceitando quando pensei que demoraria um pouco até ver o mar novamente. Descemos todos aqueles degraus até as pedras e lá sentamos. Já estava prestes a anoitecer. Foi muito bom ficar olhando para aquela imensidão azul a nossa frente, e pensando que a primeira terra firme que havia naquela direção ficava na Ásia.

Voltamos ao albergue e reencontramos os outros. Nosso avião sairia às vinte três horas e cinqüenta e nove minutos da noite, então tínhamos mais um tempo. Tomamos banho, nos aprontamos, deixamos tudo certo para ir embora e descemos até a sala de televisão para ver o primeiro tempo de Brasil X México, estréia da seleção na Copa América. O jogo começava as sete e cinqüenta, então no intervalo já era hora de pegarmos as nossas coisas, chamar um táxi e nos mandar para o aeroporto. Vale frisar que de Miraflores até lá é uma hora de carro, já que o terminal aéreo fica em Callao.

Lucimeire nos preparou uma sopa que havia comprado no supermercado. O Brasil, como de costume, estava jogando muito mal e tomou dois gols ainda na primeira etapa. Havia alguns gringos na nossa frente que ficaram agitando conosco, indiretamente, mas nem ligamos. Se formos nos vingar em cada derrota da seleção do Dunga estamos perdidos.

Fim do primeiro tempo, e fim de estada no Peru. Um dos funcionários do albergue nos chamou um táxi que logo estava na porta. Acertamos o preço e nos mandamos para Callao. Logo na primeira quadra, alguém lembrou que havia esquecido alguma coisa lá no albergue, e o taxista, muito simpático, não hesitou em dar a volta.

Aliás, que peruano gente boa àquele taxista. O Mario (nome fictício) era uma pessoa maravilhosa, que nos deu uma aula de Lima no caminho para o aeroporto. Lembrando que de Miraflores a Callao é necessário cruzar toda a cidade e passar por quase uma dúzia de municipalidades. No caminho, ele nos contou a história de cada lugar, pontos interessantes da cidade, onde começava e terminava cada municipalidad, o caminho para lugares famosos e etc... No meio da corrida ‘guiada’, ele ia encaixando histórias da sua vida, e tirando nossas dúvidas sobre o Peru. Fez questão de nos mostrar quando passou na frente da Embaixada Brasileira.

Que corrida longa. Se fosse em um táxi brasileiro, com a taxímetro rodando, tinha desistido no meio do caminho. Mario ia tocando tranqüilo, mostrando muita satisfação em nos ensinar tudo sobre a sua cidade. Lembro-me quando, já perto do aeroporto, passamos em uma grande rotatória e ele nos avisou que a pista que cortava a nossa rua era a rodovia Panamericana. “O Equador é para lá?”, perguntei apontando a direita. “É sim, é só seguir reto”, me informou. Se não fosse a imensa vontade de, naquele momento, voltar para casa poderia jurar que tive o incontrolável anseio de virar e seguir naquela direção.

Quase no aeroporto, vimos uma bifurcação na pista e Mario nos explicou que se pegássemos o outro caminho, pagaríamos um valor de pedágio, mas chegaríamos mais rápido. Como não estávamos com pressa, continuamos na pista mais lenta, porém de graça. Para entrar no Aeropuerto Internacional Jorge Chávez, passamos por uma barreira policial, onde Mario teve que mostra um documento para a polícia. “É um esquema de segurança que existe desde o tempo dos atentados terroristas”, explicou. Longa história dos problemas sociais peruanos do século XX.

Quando Mario encostou o carro, tivemos a certeza de que a corrida foi, na verdade, um passeio. Agradecemos muito e tocamos para o guichê da Aerolineas Argentinas. Tentei mudar minha passagem para uma poltrona de janela (estava no meio), mas não consegui. O vôo estava lotado. Esperamos uns quinze minutos e entramos para o embarque.

É duro ser principiante em vôos internacionais. Quando cruzamos a primeira porta do embarque é que fui perceber porque nos pedem para estar duas horas antes no aeroporto. A surpresa maior, porém, era que a taxa de embarque não estava inclusa no preço da passagem. A primeira fila era justamente para quitá-la. Não era barata (US$ 30,75) e, naquela hora, agradeci a DEUS por ter tirado um dinheirinho para me manter às oito horas de escala em Buenos Aires.

Bem explorados, digo, resolvidos, entramos na segunda fila que era a imigração. Como na primeira, demorou uns 15 minutos. O oficial de fronteira pegou o meu passaporte, olhou, recolheu a folha que havíamos preenchido na entrada, lá próximo ao Lago Titicaca, há alguns dias atrás, carimbou a saída e me liberou. Pronto, estava despatriado (rs). A última fila foi a maior, mais ou menos uns 30 minutos, e era para nos revistarem.

Comecei a ficar com uma sede incontrolável e cansado de permanecer de pé. Quando chegou a minha vez, agradeci, novamente, a DEUS por tudo aquilo ter acabado.

Antes, porém, mais imbróglios à frente. A policial que me revistou pediu que eu tirasse tudo. Isto mesmo, TUDO. Ou melhor, quase tudo. O grande problema é que estava com duas blusas de frio, câmera fotográfica, pochete e outras coisas que tive que ir tirando e colocando no detector de metais. Quando estava apenas com uma calça e uma blusa, dei um passo à frente, rumo ao detector de metais para pessoas, mas a policial encostou sua mão na minha barriga e disse: “Y su relojito....”. Pensei: “Não acredito que até isto vou ter que tirar!!”. Desabotoei o relógio de pulso, encaminhei como às outras coisas, lhe dei um sorrisinho e passei.

Ainda tínhamos meia hora na parte internacional do aeroporto. Encontramos um brasileiro já idoso na sala de embarque. Tinha vindo ao Peru sozinho para passear e quando percebi já estava contando sobre sua vida. Quanto mais ele falava, mas eu torcia para que chamassem logo para o embarque. Chamado este que atrasou uns vinte minutos, para meu desespero. Quando, enfim, anunciaram o embarque fui o primeiro a pular para a fila. Logo estaríamos sobrevoando os Andes, com destino ao Rio da Prata.

Mapa do Caminho - Dia 24

Data: 27/06/2007
Saída: Lima, Peru
Chegada: Buenos Aires, Argentina
Distância percorrida no dia: 3.150 km
Empresa aérea: Aerolineas Argentinas
Duração da viagem: pouco mais de 4h
Tarifa: +-R$ 720,00 (de Lima a São Paulo) + taxa de embarque (US$ 30,75)

quinta-feira, junho 26, 2008

Compras em um dia tranquilo

Mesmo gostando muito de viajar, há uma hora que a melhor jornada é para a nossa própria casa. Psicologicamente, a viagem já havia terminado assim que chegamos a Lima e a nossa estada na capital peruana serviu mais como uns dias de descanso do que propriamente uma visita turística. Conhecemos bem Miraflores e as suas atrações, mas Lima é muito grande e sem dúvida deixamos vários lugares para visitar em uma próxima oportunidade.

Era o nosso último dia ‘inteiro’ no Peru. O rapaz do albergue conseguiu nos realocar em um outro pequeno albergue próximo dali, já que ele não havia mais vagas para aquela noite. O nosso novo local de habitação era situado numa rua bem tranqüila, a algumas quadras da av. Larco. Era um lugar bem familiar, com pessoas muito simpáticas. Os quartos eram limpos e o ambiente amistoso. Muito bom.

Almoçamos novamente no Media Naranja. A mulher que nos atendeu acho estranho que no dia anterior uma outra funcionária tinha nos informado que não havia feijão. “O nosso estoque é bem grande e nunca falta”, esclareceu. Aliviados, pudemos degustar novamente mais um PF, que se destacava pelo feijão preto bem cozido.

À tarde já começamos a nos preparar para ir embora. Precisava comprar algumas lembranças para trazer, então fomos a um supermercado lá mesmo em Miraflores. Peguei uma Inka Kola, uma cerveja Cusqueña e um litro de Pisco. Quando fomos passar no caixa, a mulher me questionou sobre uma coisa que não estava no meu escasso vocabulário de espanhol. Como viu que eu não lhe entendia, passou a apontar para a cerveja. Só depois de algum tempo tentando imaginar o que seria é que finalmente caiu à ficha – ela queria um vasilhame, pois a garrafa da Cusqueña era de vidro. Como, certamente, eu não possuía, voltei para dentro e troquei a garrafa por uma lata.

Ao chegar no albergue, lembrei que precisava ir atrás de uma camisa oficial da seleção peruana. Não iria embora feliz sem uma, e tinha, inclusive, encomendas de amigos do Brasil. Fui a uma loja de departamento gigantesca, mas não achei. O vendedor me avisou que a original eu só acharia na loja de esportes do Larcomar. Saí de lá e segui para o shopping. Depois de uma boa caminhada, desci as escadas rolantes e dei de cara com a loja.

Eu sei que era uma terça à tarde e que a maioria dos peruanos deveriam estar trabalhando, mas mesmo assim me assustei com a falta de consumidores. As vendedoras estavam todas reunidas no centro da loja, conversando entre si. Pareceu que a minha entrada foi o acontecimento do dia. Antecipei-me a elas e logo fui perguntando pela camisa da seleção. Uma delas, bem simpática me levou até o cabideiro, onde havia várias camisas alvi-rubras. Peguei três delas nas mãos, me virei e perguntei: “Aceitam cartão de crédito?”. “Sim”, me respondeu sorridente. “Ah, então vou levar estas aqui”, emendei.

Chequei de volta ao albergue no final da tarde. Logo que entrei percebi uma movimentação na sala de televisão e fui lá conferir. Era a estréia do Peru contra o Uruguai na Copa América 2007, disputada na Venezuela. Sentei-me junto aos outros hóspedes para assistir um pouco. Um peruano que trabalhava no albergue estava hipnotizado pela televisão, vibrando a cada lance do jogo. Em toda jogada, do Peru ou do Uruguai, ele não titubeava em soltar um “carajo”. De “carajo” em “carajo” o Peru ia em frente e conseguiu surpreendentemente golear a Celeste por três a zero. Foi emoção para o ano inteiro.

Nos arrumamos e saímos para jantar e aproveitar a noite, praticamente a última antes de voltarmos ao Brasil. Fomos até a famosa Calle de las Pizzas (Rua das Pizzas), uma viela com vários restaurantes e casas de shows. Antes de chegar lá, na rua, várias vans contornavam uma praça buzinando, com torcedores do Peru gritando e exibindo bandeiras para fora das janelas. Pois é, não é só no Brasil que futebol é levado a sério (rs).

Jantamos em um bom restaurante quase no final da rua e depois seguimos para um barzinho brasileiro (outro), bem em frente. Tão bom quanto a comida do Media Naranja foi a caipirinha daquele outro lugar que não me lembro o nome. Forte e doce, do jeito que eu gosto. Para ‘animar’ a freguesia, uma jovem peruana dançava o ‘tcham’. Surpreendi-me com o seu gingado, claro, sem comparações com as brasileiras.

Apesar do bom drink, lá não estava animado, então partimos para um lugar mais agitado. Vale lembrar que na Calle de las Pizzas você não passa desapercebido. Desde o segundo que você entra lá, até ir embora, vários garçons disputam a sua atenção e tentam empurrá-lo para o seu próprio estabelecimento. Entramos em um lugar que era meio danceteria (nós, goianos, chamamos de boate, mas pode haver confusão de acordo com outras ‘culturas’), meio bar. Sentamos em uma mesa e tomamos uns drinks. Pedi um ‘Machu Picchu’, mas não gostei muito. Muito pouco de álcool e muito de um suco vermelho esquisito e enjoativo. Depois de semanas com horário para tudo, foi bom sair para beber sem ter nada marcado para o dia seguinte. A não ser, é claro, o nosso vôo, mas que era só à noite.

Mapa do Caminho - Dia 23

Data: 26/06/2007
Cidade: Lima, Peru

quarta-feira, junho 25, 2008

Andando por Lima Centro

O Peru possui diversas belezas naturais que hoje são exploradas pelo turismo. Contudo, o mais interessante em uma viagem pelo país é a comparação entre a população andina e o povo limeño. Nos altos dos Andes, os peruanos são quase na totalidade descendentes de índios e a maior parte leva uma vida financeiramente complicada pelas dificuldades econômicas da região. Já na capital, a população é caracterizada pelo biótipo europeu, com condições muito melhores por viverem em um grande centro urbano.

Miraflores é o grande exemplo da prosperidade limeña. Possui uma fileira imensa de prédios que acompanham o mar, na parte alta da cidade. Há também grandes avenidas, intenso comércio, grandes hotéis e pomposos cassinos. Isto mesmo, em Lima o jogo é uma atividade lucrativa e bem difundida. Por suas ruas, ‘cambiar’ dinheiro é uma profissão. Assim como em Goiânia há pessoas que ficam com um colete vendendo Sit-Pass (passe de ônibus), lá existem ‘cambistas’ que passam o dia trocando dinheiro a céu aberto.

Depois de uma noite de sono maior e um café da manhã tardio, saímos para andar pelo bairro. Diferentemente de todas as outras cidades que passamos, por lá não dá para visitar toda a cidade a pé, e para nos movermos a outras municipalidades é necessários utilizar os serviços de táxis ou ônibus (as vans também são bem populares).

Fomos almoçar no Media Naranja, o mesmo restaurante brasileiro onde havíamos comido no dia anterior, mas a garçonete nos informou, logo que entramos, que o restaurante estava sem feijão. Frustrados, saímos em busca de um outro lugar. Descemos até o Larcomar para comer e dar mais uma passada no shopping. O que mais de vinte dias longe de um grande centro não faz com a gente?

Voltamos ao albergue para descansar. Disputei um dos dois concorridos computadores no saguão e, pela primeira vez, reuni coragem para ligar o MSN. Vale lembrar que, naquela situação, o acessar do programa e a visualização dos meus contatos é inevitavelmente interpretado pelo cérebro como um começo de transição de volta à rotina. Estava com muita vontade de voltar para casa, mas sem entusiasmo para tornar a encarar o dia-a-dia.

Foi a partir daí que ocorreu uma confusão muito interessante entre nós quatro. Já era ponto passivo entre todos que iríamos visitar o centro de Lima. Para mim e mais uma pessoa o passeio seria naquela tarde, logo após o descanso pós-almoço. Para os outros dois só iríamos lá o dia seguinte. Isto estava tão certo na cabeça de cada um que nem discutimos. Eu deixei a Internet e comecei a conversar com o rapaz do hotel, perguntando qual era a melhor maneira de chegar lá, como fazer, qual linha de ônibus, se compensava pegar um táxi e etc..... Ele disse que com várias pessoas era melhor um táxi e continuou me explicando.

Nisto, os outros três apareceram prontos para sair e caminharam até a porta. Vendo a cena, fui ao encontro deles, ainda conversando com o peruano que me seguiu. Na porta do hotel, que dava para a av. Larco, o rapaz viu todos nós parados e pensou que estávamos pronto para irmos ao centro. Eu também imaginava isto.

O peruano não deu nem chance para qualquer reação, correu em direção à rua e parou um táxi. Eu e mais um entramos, enquanto os outros dois ficaram sem saber o que fazer. Só nesta hora que fui saber que eles iriam sair sim, mas para ir ao supermercado. O tempo era curto, porque o taxista estava fazendo fila dupla no trânsito. Não houve outro jeito a não ser todos nós partirmos para o centro.

O taxista saiu de Miraflores e logo pegou uma larga avenida, tipo uma marginal, e seguiu. Era umas quatro horas da tarde e o trânsito já começava a dar mostras de como se comportaria duas horas mais tarde. Lima Centro, o nome oficial da principal municipalidad de Lima, possui uma arquitetura muito européia, com suas praças grandes, palácios imponentes e catedrais enormes. O Centro Histórico de Lima é tombado como patrimônio histórico da humanidade desde 1988, pela Unesco.

Descemos na Plaza Mayor, local onde se situa o Palácio do Governo, sede do poder executivo peruano e residência oficial do presidente da República. O prédio é muito grande e toma toda a quadra. Possui um jardim médio e um gigantesco portão de ferro para impedir qualquer invasão. Assim como em Brasília, soldados uniformizados ficam à porta do Palácio o dia inteiro, sendo muito mais encarados como peças de ornamentação do que de segurança efetiva.

A praça é muito bonita. É o centro neurálgico da capital, fundada pelo conquistador Francisco Pizarro, em 1535. Durante os anos a praça foi utilizada para muitas funções. Já abrigou desde corridas de touros até execuções dos condenados à morte pelo Tribunal da Santa Inquisição. Também nesta praça ficam situados a Municipalidad de Lima e a Catedral.

Pegando uma rua paralela e andando praticamente um quarteirão chegamos a Plaza San Martín. Contemporânea, construída em 1921, a sua principal atração é um monumento em honra do general José de San Martín, decisivo na independência do país. Nesta praça também há varias construções histórias, tão importantes quanto belas. No centro histórico há vários calçadões que lembram um pouco São Paulo, com muito comércio e uma multidão andando de um lado para o outro.

O tempo passou rápido e quando começou a escurecer voltamos a Miraflores. Desta vez diversificamos e ao invés de descer a av. Larco até o mar, ou até o Larcomar, subimos até uma praça grande. Lá havia um McDonalds e, é claro, não poderíamos comemorar mais de vinte dias sem os prazeres das grandes cidades sem deixar marcas no mais famoso restaurante fast-food do mundo. Pedi um Quarteirão com Queijo, que lá se chama Cuarto de Libra con Quesso.

Na saída tive uma emoção intensa ao ver uma loja do Dunkin´ Donuts. Responsável pelas rosquinhas mais famosas do mundo, o Dunkin´ Donuts esteve presente durante muito tempo em Goiânia, quando eu virei freguês. Infelizmente, com o passar dos anos, o movimento decaiu e a loja fechou, não só na capital goiana como em todo o Brasil. Imagina como fiquei ao encontrar uma bem na minha frente, em Lima, há 4.500 km de casa?

Não deu outra, foi escala obrigatória depois do lanche. Não deixei a oportunidade escapar e comi várias rosquinhas (não pensem bobeira, hein? rs.). O local, na verdade, era um café muito agradável, com sofás, revistas e jornais. Uma das muitas surpresas que a capital dos peruanos ainda nos brindaria até a nossa partida de volta para casa.

Mapa do Caminho - Dia 22

Data: 25/06/2007
Cidade: Lima, Peru

terça-feira, junho 24, 2008

De volta à vida urbana

Acordei às sete da manhã e notei que estávamos parado. Do lado de fora do ônibus, três pessoas conversavam em círculo, todas com os braços cruzados e os músculos contraídos por causa do frio. Olhei ao redor, e observei um letreiro que anunciava: “Rodoviária de Nazca”. Enfim, já estávamos na famosa cidade vizinha às Linhas de mesmo nome. ‘Las Lineas de Nazca’ (As linhas de Nazca) são gigantescos desenhos de origem desconhecida que podem ser visto por meio de um vôo baixo pela região. Infelizmente não tivemos tempo para parar naquela cidade, mas quis o destino que eu, pelo menos, guardasse uma imagem do lugar.

Logo que o ônibus voltou a rodar, caí novamente no sono. Quando acordei já estávamos numa estrada de pista dupla, o que significava que nos aproximávamos de Lima. O cenário era incrível – com exceção do mar, ao lado esquerdo, tudo ao redor se resumia a areia. A paisagem parecia meio opaca, já que o céu insistia em permanecer nublado e os poucos raios de sol que rompiam a barreira de nuvens tentavam colorir os elementos.

Foi mais ou menos neste instante que a rodo-moça nos serviu o café da manhã. Logo em seguida, o tradicional bingo da Cruz del Sur, valendo uma passagem de Lima para Arequipa. Da mesma forma que na viagem anterior, ninguém de nós conseguiu fechar a cartela. Desta vez eu fui pior ainda. Vale lembrar, de novo, que de nada valeria esta passagem já que deixaríamos o país por vias aéreas dali a três dias.

Fiquei sentado no banco, vendo a rodovia e comemorando o fato de ser nossa última viagem de ônibus. Nem percebi quando a areia ao lado foi se transformando em casas e, depois, prédios indicando que já entrávamos na capital peruana. Não demorou e o ônibus pegou uma grande via expressa e seguiu em frente. Em poucos minutos, entrou em um terminal privado da própria empresa. Um passageiro, que conversava com a Lucimeire, nos alertou que era melhor descermos ali, ao invés da rodoviária, já que íamos para o bairro de Miraflores. Assim foi feito.

Depois de 21 dias tínhamos o prazer de chegar em uma grande cidade de fato. Lima tem aproximadamente oito milhões de pessoas, isto sem contar ‘El Callao’, uma ‘cidade’ conurbada com a capital e que possui quase um milhão de habitantes. As aspas na palavra cidade é porque Lima, na verdade, é o resultado de união de várias localidades que possui uma definição política entre ‘cidade’ e ‘bairro’. Explico. Lima é uma cidade sub-dividida em várias regiões chamadas de ‘municipalidades’. Podemos encarar cada uma delas como bairros, mas com algumas diferenças em relação as cidade brasileiras. Lá cada municipalidad tem a sua própria prefeitura. Mesmo assim, estas regiões não chegam a ser cidades, já que os ‘alcades’ ou ‘prefeitos’ não possuem autonomia e precisam se reportar a Municipalidad Metropolitana de Lima, que coordena toda a região metropolitana.

É muito interessante ver isto na prática. Assim como na teoria, as municipalidades são muito diferentes dos bairros das cidades brasileiras. As características próprias de cada uma são perceptíveis. Por exemplo, no Brasil você não percebe quando está mudando de um bairro para o outro. Lá tal distração é impossível. Isto porque quando você troca de municipalidade tudo muda – a cor do meio-fio, as placas em cada esquina, os tipos de jardins e etc... Além disto, toda divisão de municipalidad é muito bem sinalizada por meio de grandes letreiros, informando onde você está entrando.

Callao também é uma municipalidad, mas possui uma peculiaridade. Localizada nos limítrofes norte da capital, a cidade tem autonomia política de Lima. É em Callao que ficam as principais plataformas logísticas do Peru. O seu porto é o mais antigo das Américas e serviu como importante meio para o transporte das riquezas dos Incas a Europa. Hoje, Callao também é sede do principal aeroporto do Peru, o Internacional Jorge Chávez.

Como já disse, íamos para Miraflores, a municipalidad mais rica e famosa de Lima. A maioria dos restaurantes, hotéis, shoppings, cassinos, e outros lugares de diversão estão sediados lá. Conseqüentemente, Miraflores também tem bons albergues. De imediato fomos em um indicado por um costariqueño que conhecemos na Bolívia. Logo na entrada deu para ver que não era uma boa, já que a sua desorganização e falta de limpeza se destacavam. Além disto, eles não possuíam quartos ou banheiros privados. Como estávamos em quatro, para nós não compensava ficar lá já que poderíamos arrumar um lugar melhor por praticamente o mesmo preço. Deixamos nossa bagagem lá e saímos com a intenção de procurar outro.

Antes, porém, precisávamos almoçar. Foi então que agradeci a DEUS por estar em uma cidade cosmopolita. Em uma praça pertinho de onde estávamos, um grande cartaz anunciava “feijoada brasileira” a apenas uma rua de distância. Quase chorei ao ver aquilo, já que não comia bem há muito tempo. Ou melhor, a comida tanto da Bolívia quanto do Peru não é ruim, mas é diferente da nossa e eu estava enjoado de qualquer coisa que não fosse arroz e feijão.

Entramos no restaurante e logo vimos que era cheio de estereótipos brasileiros, com cartazes de morenas, praias do Rio de Janeiro, Cristo Redentor, e etc... Para mim isto não importava, pois estava com o foco voltado para a ‘bóia’. A feijoada era muito cara e tive medo de estragar o meu inconstante estômago. Assim, pedimos todos um PF, que vinha arroz, feijão preto, bife, ovo frito e farinha. Não há palavras para relatar a nossa emoção quando colocamos a primeira garfada na boca.

Com a barriga cheia em grande estilo, fomos procurar outro albergue. Na avenida Larco, a principal de Miraflores, havia algumas opções. Logo na primeira tentativa notei que não iríamos ficar no primeiro albergue, já que este aparentava ser muito melhor. O rapaz da recepção, muito esforçado e simpático, lamentou por não ter vagas para os três dias, mas garantiu que poderíamos ficar duas noites lá e que, depois, nos arranjaria outro albergue bom e barato. Foi o suficiente para a gente aceitar. O problema, então, foi voltar e dizer para o cara do outro albergue que não iríamos ficar lá. Sobrou para o bobão aqui enfrentar o peruano (rs).

Precisamente naquele momento, o nosso albergue tinha um problema que nos impedia de tirar um cochilo antes de sair para conhecer a cidade. Desde que pusemos o pé lá, o cheiro forte de detetização dominava o ambiente. O rapaz aconselhou a gente guardar as nossas coisas no quarto e ficarmos algumas horas na rua.

A minha vontade de descansar no início da tarde era grande, mas me contentei em ir até a costa ver o mar mais de perto. Saímos e caminhamos as dez quadras (mais ou menos) até lá. Todos estávamos com muita expectativa. Também fomos avisados que ali, bem ao lado do mar, havia um grande shopping center chamado Larcomar. Quando, enfim, chegamos ao final da avenida Larco tivemos uma pequena decepção. Para ter contato com o mar era necessário descer uns 30 metros, já que a praia ficava bem abaixo do restante da cidade, em um barranco.

Mesmo sem a altitude, os vários dias de viagem já me pesavam as costas. É claro, porém, que não deixaríamos de descer e conferir o mar de perto. Descemos uma avenida grande, que fazia o contorno por trás do barranco e descia até lá embaixo. Após meia hora de caminhada, atravessamos uma outra avenida, que contorna a parte baixa do litoral, e chegamos finalmente ao mar.

É bom enfatizar que havíamos chegado no mar, e não à praia. Mesmo porque não havia praia. A areia era mínima e as pedras pontudas dominavam a área, muito antes de onde morriam as ondas mais fortes. Além disto, o tempo nublado e o pouco de frio que fazia era suficiente para espantar qualquer pessoa dali, com exceção de alguns surfistas. Tivemos que fazer um malabarismo para ter contato com a água do mar.

Depois de uma boa caminhada pela costa, veio à hora de subir novamente para a parte alta. Não conheço Salvador, mas que falta faz, nestas horas, um elevador Lacerda. Desta vez fomos mais espertos e usamos uma escada construída, tipo passarela, para voltar. O esforço, contudo, não foi menor, e toda aquela caminhada fez com que pensássemos duas vezes antes de descer novamente até o mar. Mesmo porque se não dava para entrar, era melhor olhar de longe.

À noite decidimos conhecer o Larcomar e aproveitar para jantar. O detalhe interessante é que o shopping fica no final da avenida Larco, mas quem chega lá pensa que errou o lugar. Aconteceu conosco, já que não percebemos logo de cara que o shopping, na verdade, foi construído no meio do barranco, entre a parte alta e a baixa. Desta forma, ele fica inteiramente abaixo do nível da cidade. No local indicado pelo mapa há apenas as escadas rolantes que conduzem as pessoas para dentro do shopping.

A sua construção, porém, vale a visita. Totalmente aberto, o shopping é um local agradabilíssimo, tanto para fazer compras, comer, ou apenas ficar olhando as ondas do mar. A emoção veio à tona, novamente, quando chegamos na equipada praça de alimentação. Não deu outra, escolhi comer no Burger King. Apesar de toda a carga cultural que ganhamos nos últimos 21 dias, era muito bom estar diante de algo familiar.

Na volta ainda passamos em um bar que tinha como tema o futebol, com várias camisas expostas nas paredes e televisões passando programas esportivos em um ambiente bem agradável de pub. Local perfeito para brindarmos a chegada ao ponto derradeiro de nossa jornada.

Mapa do Caminho - Dia 21

Data: 24/06/2007
Cidade: Lima, Peru

segunda-feira, junho 23, 2008

As últimas horas nos Andes

Como precisávamos marcar o passeio com a agência de turismo e comprar a passagem para Lima, acordamos cedo e logo estávamos caminhando pelas ruas de Arequipa. Algumas quadras depois lá estávamos na agência que acreditamos ser a melhor das quais tínhamos pesquisado. Entramos e acertamos o chamado ‘Tour Campiña’ para tarde. Como era uma agência grande, e eles revendiam passagens da Cruz Del Sur, matamos dois coelhos com uma cajadada só e compramos também o bilhete para a capital peruana.

A nossa intenção era percorrer os mais de mil quilômetros entre Arequipa e Lima durante o dia, já que a grande parte da viagem se passa na famosa rodovia panamericana, margeando o oceano pacífico e garantindo uma vista magnífica, principalmente para quem está passando por lá pela primeira vez. A Cruz del Sur, porém, não possui horários durante o dia, o que nos fez abandonar a idéia já que teríamos que ir até a rodoviária, procurar outra companhia, ver se era boa ou não, e tomar outras providências. Não estávamos querendo muita complicação nesta altura da viagem.

Na hora do almoço, aproveitamos o nosso último dia na cidade branca e optamos por um restaurante que ficava no terraço de um dos prédios da Plaza de Armas. Não lembro o que comi, apenas que a vista era deslumbrante. De lá dava para observar, ao mesmo tempo, a praça, a catedral, os prédios brancos e o vulcão Misti. A refeição foi só um detalhe, mesmo porque já estava com saudades da comida do Brasil e nada mais que pudessem me servir ali me apeteceria.

Durante o almoço, subiram algumas pessoas que tocavam música peruana em troca de dinheiro. Diferentemente do Brasil, onde as pessoas que oferecem um serviço em troca de moedas ou pequenas quantias aceitam um ‘não’ tranqüilamente, no Peru estes ‘autônomos’ não ficam feliz se você os ignoram. Eles são muito insistentes, como se você tivesse obrigação de lhe pagar algo por um serviço não solicitado. Acho que dei alguns centavos de soles somente para que fossem embora.

Voltamos ao hotel para fechar a nossa conta e liberarmos o quarto. Deixamos as nossas mochilas lá mesmo, enquanto fazíamos o passeio. Esta é uma prática comum nos albergues e, até mesmo, nos hotéis da Bolívia e do Peru. Quando você não vai ficar mais uma noite e a diária acaba na hora do almoço, considerando que você só sairá da cidade à noite, a melhor opção é deixar a bagagem no próprio hotel. Em todos que passamos não tivemos problemas quanto a isto e é bem seguro.

A nossa van do passeio saiu da agência de turismo, que ficava a poucos metros da Plaza de Armas. O Tour Campiña era destinado a turistas que queriam conhecer os arredores de Arequipa, mas não tinham tempo, assim como nós. Foi um dos poucos passeios que fizemos de improviso, sem ter planejado antes. Foi feito no estilo ‘grupo privado’, que só vai a gente, sem outros turistas. Agora não me lembro se era a característica do pacote que compramos ou se foi porque não havia mais ninguém no dia.

Serei sincero – hora nenhuma me empolguei com o Tour Campiña. Acredito que vale a pena, mas não há nada de espetacular. Acho que meu estado de espírito também influenciou negativamente. Depois de tantos passeios que fizemos até então, já estava cansado de bancar o turista (rs). Naquela tarde, visitamos muitos lugares bonitos, casas históricas com aquelas portas e paredes bem grossas, igrejas, alguns pequenos monumentos e a área agrícola da cidade. O nosso guia era muito bom e simpático, nos explicou as histórias que estavam por trás de cada lugar.

O que mais me chamou a atenção foi à visita a uma torre alta, onde eu defini muito bem o meu medo de altura. Estive em Machu Picchu, onde dava para ver o Rio Urubamba a 600 metros abaixo e me senti tão seguro como se estivesse em casa. Já no caso desta pequena torre, que não devia ter mais de 40 metros, quase empaquei no meio do caminho. O que importa não é a altura e sim o quanto você se sente seguro. Neste lugar, as escadas eram todas vazadas e a altura era totalmente vertical. Quando cheguei lá no terraço fiquei segurando firme para amenizar as más impressões. Pelo menos valeu muito a pena, já que a vista é única.

Estávamos de volta ao centro de Arequipa no início da noite. Pegamos as nossas coisas no hotel e nos mandamos para a rodoviária. Chegando lá comemos alguma coisa, mas já contávamos com a comida no ônibus. Assim que se aproximava a hora do embarque crescia uma nova expectativa por dois motivos principais. Ao mesmo instante que estava dando adeus à altitude, e meu estômago agradecia, nas próximas horas estaríamos ao lado do Oceano Pacífico. É claro que não há muitas diferenças entre o Pacífico e o Atlântico, mas para qualquer goiano estar próximo do mar já é motivo de festa. E eu não visitava o oceano desde 2004.

O adeus a Arequipa foi mesmo na hora de colocar o primeiro pé dentro do ônibus, pois logo que ele partiu fiquei entretidos com o que acontecia dentro. Primeiro, vale ressaltar que mais uma vez tivemos sorte, já que o ônibus estava novamente vazio e pudemos dormir em dois bancos. O segundo detalhe era a minha ansiedade pela bóia. Não demorou muito para que fossemos servido, como na viagem passada. Desta vez, porém, não ouve bingo depois da janta. Ficou para o dia seguinte.

As quatro primeiras horas da viagem foram de descida do que restava da Cordilheira dos Andes. Não demorei muito para dormir, mas acordei várias vezes e percebi que descíamos bastante. Mais um cochilo e quando voltei a acordar notei que já estávamos seguindo por uma estrada plana. Não demorou muito para sentir o cheiro de sal dominando o interior do ônibus, mesmo com o ar condicionado. Olhei para fora, pelo lado esquerdo, e vi as ondas batendo nos rochedos escuros cobertos pela imensidão da noite. Já estávamos na praia.

Mapa do Caminho - Dia 20

Data: 23/06/2007
Saída: Arequipa, Peru
Chegada: Lima, Peru
Distância percorrida no dia: 1.009 km
Empresa de ônibus: Cruz del Sur
Duração da viagem: +- 14h
Tarifa: s/ 85,00 (R$ 54,85 à época)

domingo, junho 22, 2008

Pela cidade branca

Chegamos a Arequipa bem de manhã, antes das sete horas. Ao desembarcar na rodoviária logo vimos que, mesmo já na parte final de nossa viagem, ainda viveríamos situações que nos causaria surpresa. Por exemplo: existe uma política da prefeitura de Arequipa que garante táxi gratuito para os turistas que desembarcam na cidade. Eu, sinceramente, nunca havia visto isto na minha vida. Ficamos até meio desconfiados da oferta, mas, como se provou ser verdadeira, não demoramos em aproveitar o benefício de, finalmente, sermos ‘VIP’ em algum lugar e podermos usufruir alguma vantagem.

Assim, desta vez, não precisei negociar a exaustão com o taxista para ele fazer a corrida mais barata. Bastou perguntar se realmente o benefício estava valendo e embarcar. Mais uma vez o excesso de sono impedia atitudes mais lúcidas e transparentes. Chegou a parecer que tudo aquilo era apenas alucinação do nosso estado de fatiga. Contudo, quando percebemos já estávamos andando pelas ruas da cidade.

Precisávamos de um hotel, e o nosso motorista ‘na faixa’ assumiu a nossa necessidade como sua causa. Naquele momento, nem utilizávamos mais o nosso roteiro - íamos caminhando e tomando decisões de acordo com a situação. O motorista nos informou que conhecia muitos hotéis e que conseguiria um lugar legal por um bom preço.

Como era muito cedo, havia o problema de alguns hotéis ainda não estarem com as suas portas abertas. Foi assim no primeiro hotel que ele nos levou, onde tocamos a campainha e o peruano que atendeu, depois de uma longa demora, estava com uma cara de sono mais inchada do que a nossa. Não havia vagas. No segundo hotel não me lembro qual foi o problema, mas também não deu certo. Só fomos conseguir, finalmente, nos alojar no terceiro.

Era um hotel mesmo, sem características de albergue. Eles nos fizeram um preço especial, meio caro para o padrão que adotamos em toda a jornada, mas que pela nossa situação acabamos aceitando. Pegamos a nossa bagagem no táxi, e fiz questão de dar uma boa gorjeta para o motorista, que havia nos ajudado muito a encontrar o hotel, sem pressa, com bastante paciência e o melhor, de graças (rs).

Mal entramos no quarto e tiramos o restante da manhã para descansar. Aliás, a terceira parte da viagem foi marcada pelo nosso baixo vigor físico. Depois de quase vinte dias de intensa movimentação, passeios, viagens e pouco sono, o corpo acabou pedindo ajuda. O fato prejudicou um pouco a nossa intenção de conhecer as últimas cidades e lugares, mas também nada mais justo que nos dar um pouco de descanso, depois de tudo o que se passou. Afinal, estávamos de férias. Desta forma, saímos só mais tarde, para conhecer a cidade e almoçar.

Arequipa é uma bela cidade. Aos pés do vulcão Misti, tem o apelido de cidade branca. Isto porque grande parte das construções foi feita usando como base uma rocha vulcânica branca, que deu um toque especial à cidade. Ela também fica em uma região muito árida dos Andes, quase desértica, e foi construída em uma área de oásis. Há uma praça principal, a Plaza de Armas (quase todas as cidades por aqui tem uma grande praça com este nome), onde se localiza a maior parte do comércio, bancos, lojas de conveniência, restaurantes e outros.

Além da escalada do vulcão Misti, que certamente é um passeio tão maravilhoso quanto estafante, Arequipa também é o centro para os turistas que querem conhecer o famoso Canión del Colca, a 160 quilômetros a noroeste da cidade. O Colca, como é conhecido, é quase duas vezes mais profundo do que o Grand Canion, nos Estados Unidos, sendo que as suas ‘paredes’ não são tão verticais quanto às do seu primo gringo.

Como não tínhamos tempo para fazer nem o Colca, nem o Misti (geralmente são feitos em dois dias), procuramos um passeio mais light, que poderia nos dar a idéia da região. Visitamos algumas agências de turismo, conversamos com algumas pessoas, mas só fechamos no dia seguinte. Escolhemos um passeio chamado Campiña, que nada mais é do que um tour por Arequipa e arredores.

Após o almoço, fomos cuidar das nossas mais diversas necessidades funcionais (banco, fotos, câmbio e outros) e tratamos de dar um bom passeio pelo centro. A Plaza de Armas é algo fantástico, com todos os seus prédios brancos e muitos coqueiros no centro. Coisa de cinema. Logo ali, em uma rua paralela, gastamos um bom tempo em uma livraria, escolhendo algumas obras em español para levar de volta ao Brasil. Eu comprei um livro da história do Peru, mas ainda não li. Pretendo em breve.

Já no entardecer, paramos em um dos muitos cafés que existem na cidade para comer alguma coisa. Estava muito a fim de experimentar uma das maravilhosas tortas que estes locais exibiam pelas janelas, mas meu estômago, mais uma vez, reclamava, então me contentei com um chá de coca. O meu alívio era que estávamos nos últimos dias de altitude. Depois de Arequipa, que já não é tão alto (2.400 metros acima do nível do mar), o nosso destino era o litoral.

Uma cena que jamais esqueço foi quando, já à noite, passamos por uma das ruas principais da cidade e vimos uma igreja toda decorada. Assim que cruzamos a porta, um carro chique parou bem na nossa frente e de dentro saiu uma noiva. No pátio, de fora da igreja, muitos convidados assistiam a cena. Com cara de quem estava várias semanas viajando pela América do Sul e condições de quem esteve caminhando pelas ruas o dia inteiro, tratamos logo de sair dali. O jeito foi descansar mais, já que no dia seguinte ainda tínhamos muito chão até Lima.

Mapa do Caminho - Dia 19

Data: 22/06/2007
Cidade: Arequipa, Peru

sábado, junho 21, 2008

Dia seguinte

Não havia bebido, mas acordei com ressaca devido à carga de emoções do dia anterior. Os próximos passos da nossa jornada também ajudavam a ficar em um estado de ‘final de festa’ já que ao nascer do sol entrávamos na terceira e última parte da viagem. Sem ter mais Machu Picchu como foco, agora pensávamos em Lima, a capital peruana, e na volta para casa.

Era uma quinta-feira, mas o dia tinha cara de domingão brabo. As horas passavam devagar e na simples cogitação de fazer qualquer coisa reinava uma preguiça total. Tomei café da manhã e logo lembrei que a Marina havia nos deixado. Por causa de um problema particular, ela voltou mais cedo para casa, pegando um vôo logo de manhã. O quinteto passou a ser quarteto.

A nossa missão, a partir daquele momento, era chegar até Lima. O problema é que se comprássemos uma passagem direto para lá, viajaríamos por uma longa estrada de terra pelos Andes, com previsão de 24 horas dentro do ônibus até a capital. Isto a na teoria, porque como a estrada era ruim as chances do ônibus quebrar no meio do caminho eram grandes. Sem contar na poeira e no risco.

Desta forma, quando planejamos a viagem, decidimos que iríamos até Arequipa, no sul do país, e de lá seguiríamos pela rodovia panamericana, margeando o oceano pacífico, até Lima. Fomos então em busca de um meio rápido, fácil e eficiente de chegar até Arequipa. E encontramos. Sem querer fazer propaganda, mas já fazendo, descobrimos a companhia de ônibus Cruz del Sur, que é melhor do que qualquer outra que já tive a oportunidade de experimentar no Brasil. A preços módicos a gente teve um serviço de primeira. E olha que estávamos falando de duas viagens grandes (Cuzco-Arequipa e depois Arequipa-Lima).

O nosso ônibus sairia às oito e meia da noite, então tínhamos todo o dia em Cuzco. Almoçamos e à tarde a preguiça voltou a bater. Era uma sensação estranha de preguiça, cansaço e vontade de voltar para casa. Parece que finalmente caí na real de que a vida continuaria depois da viagem, e passei a lembrar de Goiânia e de meu trabalho.

Acho que a ressaca emocional era geral, de todos nós. Estávamos muito felizes do que vimos no dia anterior, mas, ao mesmo tempo, sem atrativos. Então, a Lorena achou um joguinho na Internet, de ficar adivinhando o nome do filme pela música, e jogamos a tarde inteira. Hoje bate um pequeno arrependimento, já que poderíamos ter usado melhor aquele tempo, mas logo me consolo que não tinha outro jeito. Tem hora que você é mais feliz fazendo algo que lembre o seu dia-a-dia do que qualquer visita a qualquer lugar do mundo.

A tarde foi chegando ao seu final, e então saímos para comemorar a bem-sucedida passagem por Cuzco e Machu Picchu. Encontramos um bom barzinho perto da Plaza de Armas e fomos beber um pouco. Eu e o Rodrigo pedimos Pisco, a tradicional bebida peruana. Como eu fui mais mão de vaca e pedi um drink mais barato, acabei achando o dele mais gostoso. De qualquer forma, Pisco é uma bebida que vale a pena provar quando se está no Peru. Tanto que levei uma garrafa para casa.

Já estava anoitecendo quando voltamos ao hotel pela última vez. Arrumamos todas as nossas coisas, fechamos a mochila e nos despedimos do quarto que foi a nossa casa durante os dias que passamos na capital Inca. Cuzco, sem dúvida nenhuma, deixa saudades. Principalmente por ser uma cidade carregada de cultura. Foram cinco dias praticamente sem parar no hotel e, mesmo assim, deixamos a cidade com muita coisa ainda para ver, visitar e sentir. Se você estiver planejando uma viagem a Cuzco, siga o meu conselho – reserve uma semana inteira para a cidade e região (sem contar Machu Picchu).

Pegamos um táxi e seguimos para a rodoviária. Bem no horário, lá estava nosso ônibus, grande, de dois andares, pronto para pegar estrada. Logo que entramos vimos que tínhamos acertado em viajar com aquela companhia. O ônibus era muito bem conservado, poltronas novas e bem limpo. Assim que começamos a rodar, um homem bem uniformizado passou a andar pelo corredor e a mexer em vários compartimentos que havia atrás, bem ao lado da porta do banheiro.

Era um rodo-moço. Nunca tinha visto um em linhas tradicionais, aqui no Brasil. E lembrar que alguns de nós não sabiam que havia alguém para servir e, logo que entramos, foi lá mexer nas coisas do cara e pegou um copo de chá. Ainda bem que ninguém viu. Diferentemente das companhias de trem, todo o serviço dentro do ônibus já estava incluído no preço da passagem.

Em uma hora de viagem, veio a surpresa maior. O rapaz ligou o sistema de som do ônibus e anunciou a cena (janta). Distribuiu para todos uma bandeja com comida, da mesma forma que em um avião. Só que o rango era bem mais gostoso. Além da comida - arroz, uma tortinha, bife, legumes e outros - também havia uma pequena sobremesa.

Com a barriga cheia, as surpresas continuaram. Logo após ajeitar tudo, o atendente anunciou um jogo de bingo. Isto mesmo, bingo, valendo uma passagem de volta para quem fechasse a cartela. É claro que nenhum de nós acabou tendo sorte o suficiente, mas foi uma boa distração. O melhor da noite, ainda, foi que o ônibus estava vazio, ou seja, pudemos dormir ocupando dois lugares que, por sinal, contavam com poltronas muito confortáveis. Uma compensação para quem teve que agüentar oito horas naquele trem até Aguas Calientes.

A maior parte do caminho até Arequipa foi voltando na mesma estrada em que fomos de Puno a Cuzco. Assim que chegamos a Juliaca, a poucos quilômetros de Puno e do Lago Titicaca, tomamos a direção do litoral até o destino final. Descemos um pouco também, já que Arequipa já fica na parte de declive dos Andes, a 2.400 metros acima do nível do mar.

Logo depois do habitual filme (isto não tem jeito, todas as companhias passam), caí no sono. Abri os olhos algumas vezes durante a noite, mas só fui realmente acordar quando chegamos na rodoviária de Arequipa.

Mapa do Caminho - Dia 18

Data: 21/06/2007
Saída: Cuzco, Peru
Chegada: Arequipa, Peru
Distância percorrida no dia: 513 km
Empresa de ônibus: Cruz del Sur
Duração da viagem: +- 10h
Tarifa: s/ 75,00 (R$ 48,40 na época)

sexta-feira, junho 20, 2008

Enfim, a cidade perdida

Ainda era noite quando acordamos, pouco depois da seis da manhã. Em Aguas Calientes o sol demora a sair por causa das altas montanhas que se situam ao redor da cidade. O meu cansaço fez com que o sono fosse instantâneo. Apesar de ser um hotelzinho pequeno, o quarto e a cama eram muito boas. Nos aprontamos e subimos para tomar café.

Estávamos um pouco desconfiados do nosso guia, o Javier. No dia anterior, ele havia nos questionado para saber quem tinha documento de estudante. Quando nós compramos o pacote do passeio na agência, dois de nós informaram que possuíam a carteira de estudante internacional Isic, a única que dá meia entrada em Machu Picchu. Desta forma, o nosso pacote estava contando três entrada inteiras e duas meias. Javier nos disse que conseguiria passar todos como meia se tivéssemos qualquer documento de identificação de estudante.

O pior é que nós três tínhamos alguma carteirinha que poderia se passar por documento de estudante. Javier nos pediu para ficar com as carteirinhas um dia antes e não nos entregou mais. O problema maior é que ele não explicava direito o que queria fazer e, principalmente, quem ficaria com a diferença. Somente mais tarde é que ele explicou que a sua intenção era pagar um almoço a todos com o dinheiro que sobraria, pois a alimentação do segundo dia não estava incluída.

De manhã eu já previa um desconforto entre Javier e alguns de nós. Como eu havia feito as contas e vi que não sobraria nada para ele, deixei quieto e fiquei observando para ver no que dava. Ele nos explicou que isto era comum, que tinha contatos no santuário e garantiu que ninguém seria impedido de entrar nas ruínas. Todo o caso causou um desgaste imenso e, como fiquei na retaguarda, no final acabei sendo o único a passar como estudante. Verdade seja dita, a minha carteirinha era de estudante e era internacional, só que era de uma associação de estudantes de Goiás.

Enfim, deixemos os contra-tempos de lado, afinal estávamos a poucos minutos de Machu Picchu. Fomos até a praça principal da cidade de onde, bem ao lado, saíam as vans até Machu Picchu. O guia nos entregou a passagem e embarcamos. A empresa que fazia o serviço era muito boa, com carros novos, motoristas uniformizados e bancos confortáveis.

No total a subida dura uns 20 minutos. Não sei se expliquei direito nos dias anteriores, mas Machu Picchu fica a cerca de 600 metros acima de Aguas Calientes. Praticamente não há distância horizontal, só vertical. Um dia antes, durante o passeio a Mandor Pampa, Javier nos levou no lugar exato onde o explorador norte-americano Hiram Bingham avistou a cidade perdida pela primeira vez (em 24 de julho de 1911). Foi em um local perto da cidade, no caminho para Mandor Pampa, junto aos trilhos do trem. Hiram perguntou a um fazendeiro peruano se ele conhecia alguma ruína histórica e, daquele mesmo lugar, o rapaz apontou para cima mostrando Machu Picchu.

Quando Hiram perguntou se ele o poderia guiar até lá, o peruano se assustou e disse que ele estava loco, pois era uma subida muito complicada e o risco bem grande. Não valia a pena. Cerca de 96 anos depois, subimos até o sítio arqueológico por uma pequena estrada de terra, estreita, que de vez em quando a nossa van precisava encostar para que uma outra, que vinha em direção contrária, conseguisse passar.

O desembarque é bem na porta do único hotel existente em Machu Picchu. O Machu Picchu Sanctuary Lodge é um hotel cinco estrelas construído ao lado das ruínas. O preço não é para simples mortais como a gente. Lá dentro existe um restaurante tão caro quanto as diárias do hotel. Mais à frente, há uma lanchonete mais simples e, entre os dois, ficam as escadas que sobem até a entrada da cidade perdida.

Chegamos bem cedo, mas já havia uma boa quantidade de pessoas esperando para entrar. Fila para passar pela catraca, um monte de gringo, lanchonete seguida de um monte de mesas, e uma atração que envolve altura, todo este ambiente me fez sentir que estava em um parque de diversões. A sensação foi boa, porque gosto de parques. Já na fila, percebia que havia muitas nuvens baixas e torcia para que elas não atrapalhassem o cenário. Não atrapalhou.

Depois que o fiscal destaca o talão de entrada e você passa pela catraca, não se anime, você não chegou ainda. Existe uma pequena trilha de subida até o ponto alto do passeio. Creio que, ao todo, dá uns 200 metros, mas quando você atinge este ponto qualquer distância parece uma eternidade. Para piorar, a trilha é em meio à mata fechada, ou seja, até o final você não vê nem um pedacinho para matar a curiosidade. No entanto, depois de superado a trilha vem à recompensa - a visão tradicional de Machu Picchu, com toda a sua grandeza e esplendor.

É surpreendente. Principalmente porque você está lá, subindo aquele ‘maldito’ caminho, quando de repente as árvores se abrem e você dá de cara com a cidade perdida. Uma emoção inenarrável.

Circular por Machu Picchu é algo incomum. Como já escrevi neste blog, em um post horas depois de deixar as ruínas, a cidade te acolhe. É muito esquisito. Dizem que há muita energia positiva. Depois de visitá-la, não tenho alternativa a não ser acreditar.

Você está em um país distante, no alto de uma montanha, olhando o Rio Urubamba lá embaixo, com todos aqueles terraços e ruínas e, mesmo assim, se sente em casa. Pelo menos foi o que senti. Todo o meu desânimo do dia anterior passou em questão de minutos. Foi como se eu tivesse ido até o meu quarto e voltado para o Peru. Incrível.

Passamos a primeira hora do passeio ouvindo as explicações de Javier. Ele nos levou em todas as partes das ruínas e nos explicou a história do lugar, o que significava cada salão, a estrutura da cidade, enfim, nos passou as informações (como dizia a nossa velha amiga Tia Qéchua). Machu Picchu era dividida em três partes, a zona habitacional, a agrícola e a religiosa. É claro que na religiosa ficam os lugares mais interessantes. Bem no meio da cidade, em uma área de transição, há um jardim de inverno muito bonito, onde se pode descansar do passeio.

Logo ao lado deste jardim, há também uma grande área bem plana, com um gramado verdinho. Vendo aquele cenário, bateu uma vontade imensa de aproveitar o local para jogar futebol. É uma área especial - pelo fato de ser uma posição bem central e haver terraços altos em todas as direções, não dá para perceber a altura que você está em relação ao vale. Isto é importante para pessoas que, como eu, tem um pequeno medo de altura (rs.). É bom explicar que, em todo o passeio de Machu Picchu, apesar de vários pontos serem bem abertos, não deu um pingo de medo.

Depois da visita guiada, Javier se despediu e nos deixou com as passagens para voltar a Cuzco. Saiu visivelmente chateado com a história das carteirinhas, mas, enfim, ele teve a sua culpa no processo. A partir daí, a diversão começou. Foi como quando a professora do primário larga a turma de crianças para elas poderem brincar no parque. Rodrigo, Lucimeire e Marina optaram por subir o Huayna Picchu, aquela montanha famosa que aparece em todos os cartões postais de Machu Picchu. Como eu sabia que só ia passar medo e me cansar à toa, decidi explorar melhor as ruínas. Lorena me acompanhou.

Ficamos mais uma hora andando por Machu Picchu. Foi quando subi até o local onde se tiram as famosas fotos de do local, bem perto da entrada. O detalhe é que as ruínas da cidade perdida é um verdadeiro labirinto. Você mira um ponto para ir, mas gasta muito tempo até achar o caminho para chegar lá. Encontrei algumas llamas durante a caminhada e não perdi a chance de clicar. Já na melhor visão de todo o sítio arqueológico, sentei em um terraço e por lá fiquei mais de hora descansando, pensando e visualizando.

Foi difícil despedir de Machu Picchu. Como na entrada, deu a sensação de estar deixando um parque de diversões, cheio de brinquedos legais para se divertir. Uma última olhada no cenário, e encarei a trilha de volta até a lanchonete. Depois de esperar mais de meia hora para reunir com o restante do pessoal, em vão, eu e Lorena descemos de volta a Aguas Calientes.

Estava morto de fome, mas queria comer algo descente. Encontramos um bom restaurante que cobrava caro, mas tinha um buffet muito bom. Não pensei duas vezes, já que naquele dia valia tudo. Era self-service e naquela altura da jornada já estava enjoado de comer ‘a la carte’. Descobri que não há nada melhor do que você servir a própria comida, pois dá para pegar só aquilo que mais te apetece, já que é possível ver a cara de cada prato. No sistema ‘a la carte’, muitas vezes você escolhe um prato que te dá vontade na hora, mas quando chega você não vai com a cara da comida.

Alimentados, fomos dar uma última volta na cidade. Há uma estátua maravilhosa do Inca na praça principal e, é claro, não poderia passar sem tirar fotos. Fomos também em um mercado, perto da ferroviária, fazer compras. Tive uma aula de zampoña (um instrumento de sopro típico do Peru) de uma vendedora que insistiu em me ensinar a soprar certo. No final a estratégia deu certo, já que fiquei sem graça e comprei o instrumento.

Nos reencontramos todos no hotel. Arrumamos nossas coisas e, pouco antes das cinco da tarde, rumamos para pegar o nosso trem. A estação é muito bem arrumada, parece até que estávamos na Europa (mesmo sem nunca ter ido na Europa, mas creio que não deve ser muito diferente). Embarcamos e, assim que entrei no vagão, levei um susto. Lembra daqueles bancos horríveis, que ficam um virado para o outro e não há espaço para os dois passageiros colocarem as pernas? Na minha frente uma mulher francesa levava uma criança, já não tão criança, no colo. Já pensava que teria uma viagem daquelas, espremido contra o meu assento, quando um dos atendentes chamou a mulher e lhe informou que atrás havia dois lugares vagos. Sorte é sorte, e me deu a oportunidade de vir com minhas pernas esticadas durante todas às quatro horas de viagem de volta a Cuzco.

Já era mais de oito da noite quando o trem entrou em processo de descida. Foi no mesmo esquema da ida, com o trem andando para frente e de ré. Quando desembarcamos em Cuzco, vimos os dois rapazes peruanos da nossa agência que tinham ido nos pegar para nos conduzir ao hotel. E eu que pensei que eles não lembrariam da gente. Nesta hora eu estava muito curioso, querendo me informar sobre o resultado de Grêmio X Boca Juniors, que decidiam a Libertadores, no Olímpico, em Porto Alegre. Mal cheguei no hotel, corri para a Internet a fim de acompanhar os minutos finais no Placar UOL. Já havia passado dos 40 minutos do segundo tempo e, assim como na primeira partida, o Boca goleava o tricolor gaúcho. Eram os últimos minutos de um dia inesquecível.

Mapa do Caminho - Dia 17

Data: 20/06/2007
Saída: Aguas Calientes (Machupicchu Town), Peru
Chegada: Cuzco, Peru
Distância percorrida no dia: 112 km
Empresa de ônibus: Peru Rail
Duração da viagem: +- 4h
Tarifa: US$ 35,50

quinta-feira, junho 19, 2008

Aos pés do Santuário

Tive uma noite de cão. Logo que me deitei, meu estômago começou a doer e eu, como estava muito cansado, preferi ignorá-lo e dormi. Acordei algumas vezes durante a noite, com desconfortos. Tomei uns remédios que estavam próximos à cabeceira da cama e voltei a dormir.

Quando acordei no outro dia estava melhor, mas foi só me colocar de pé que o estômago se manifestou impiedosamente. Eu não poderia me dar ao luxo de ficar dando muita atenção para o meu estado, já que precisava arrumar as minhas coisas e embarcar para Aguas Calientes, a cidade mais próxima a Machu Picchu.

O pessoal da agência nos buscaria no hotel e o trem sairia pontualmente, então não podíamos nos atrasar. Começamos a mobilização para estar tudo pronto logo. Não tínhamos muito tempo e ainda precisávamos acabar de arrumar tudo e acertar as diárias do hotel. Foi uma confusão só.

A dor ia e vinha, mas quando coloquei o pé na soleira da porta para sair do quarto ela veio impressionantemente forte. Estava meio tonto quando acertei a minha conta com o rapaz do hotel. Pedia a DEUS para melhorar logo, já que estávamos prestes a embarcar. ELE, é claro, me ajudou mais uma vez.

Quando o pessoal da agência chegou, fomos logo colocando tudo nos carros. Haviam trazido dois carros grandes, para caber tudo e todos. Eram dois peruanos muito simpáticos, que nos atendeu com prazer. Antes de entrar no carro, um deles me deu um envelope grosso para entregar ao guia, em Aguas Calientes. Achei muito estranho ele confiar isto a mim, já que dentro havia todo o ‘suporte’ necessário para o nosso passeio (além de passagens e guias de reservas, também havia uma boa quantia em dinheiro).

Estava bem melhor, mas tinha muito medo da dor voltar. A dupla de peruanos nos deixou na estação de Cuzco, e fomos logo procurar o nosso trem para não atrasarmos. Javier (nome fictício), o nosso guia, foi um dia antes e nos esperaria na estação. Logo que entramos no vagão, vimos porque que a nossa classe era chamada de ‘backpacker’ (mochileiro). Os bancos, além de não serem muito confortáveis, eram virados uns para os outros, tipo transporte coletivo, quando você vai olhando para a cara da pessoa à sua frente que, por sua vez, vai de costas para o motorista.

Não tinha nenhum problema em passar quatro horas olhando para a cara de um estranho, o grande incômodo foi o pequeno espaço para por as pernas que, nesta situação, era compartilhado com o ‘meu companheiro’ de viagem. Preciso dizer que mal cabiam as minhas pernas, quanto mais as minhas e as da outra pessoa? Enfim, pensamento positivo, eram apenas quatro horas.

Logo na saída de Cuzco uma situação engraçada que me lembrou alguns relatos de viagens que eu li antes de iniciar a jornada. Lembra-se quando disse ontem, que para chegar ao Vale Sagrado precisávamos subir uma grande montanha? E lembra-se também que eu expliquei que a linha do trem percorria todo o Vale Sagrado, margeando o rio Urubamba? Então, para chegarmos ao vale, primeiro, tínhamos que encarar uma boa elevação. Para um carro é fácil, agora para um trem.....

Os peruanos, porém, fizeram um sistema muito legal para subir a montanha. Não sei se o ‘esquema’ existe em outros lugares (posso até estar falando de algo comum em engenharia ferroviária, não sei), mas foi muito interessante presenciar aquilo. A estratégia de subida era composta de vários trilhos, em diversos níveis de altitude. O trem andava uma longa linha reta, já na encosta da montanha e, quando chegava no final dos trilhos, eles comutavam a linha de ferro para outra, um pouquinho mais alta. O trem, então, voltava nesta nova linha, só que agora de marcha ré. E assim ficava indo, para frente e para trás. Dentro do trem, nós só notávamos que estávamos subindo quando olhávamos pela janela e via Cuzco cada vez mais abaixo. O processo todo durou uns 40 minutos.

O trem logo chegou ao Rio Urubamba e, a partir daí, pudemos conferir o Vale Sagrado de perto. A paisagem era mais bonita vista de cima das montanhas, mas, desta vez, pudemos conferir os detalhes. O rio é um pouco extenso, mas não chega aos pés dos grandes rios brasileiros.

Logo que passamos a andar só para frente, uma atendente (treno-moça, será que é isto?) nos entregou um cardápio. Mesmo viajando em um lugar desconfortável, havia serviço de bordo. O problema é que os preços eram absurdamente caros. Como para mim ter o meu estômago saudável não tem preço, pedi um mate de coca. Mesmo não tendo comido nada desde quando acordei, não tinha fome e nem estômago para algo mais além do chá.

Alias, não era só o serviço que era caro. A passagem do trem até Aguas Calientes é um desrespeito com o turista. Foi o quilômetro rodado mais caro (ver quadro abaixo) que pagamos em toda a jornada, para ficarmos em uma posição desconfortável por quatro horas. Assim como na Bolívia, os serviços férreos no Peru também são privatizados e as empresas elevam o preço para lucrar em cima dos gringos que pagam em dólares ou euros. Para nós, que ganhamos em reais, o preço é alto. Soma-se ainda que o trem é a única opção (fora a Trilha Inca, que se vai a pé) de chegar até Machu Picchu. Resumo: empresa privada mais monopólio é igual a clientes explorados. Ah, que saudades do Trem da Morte! (rs).

Na minha frente havia uma dupla de gringos, mais precisamente pai e filho. Eles conversavam em inglês bem baixo, mas às vezes dava para entender. Meu chá chegou bem quente e com muito pouco açúcar. Foi aí que agradeci a minha experiência de La Paz (leia mais abaixo) e tomei sem problemas, bem devagarinho.

À medida que íamos nos aproximando do final da viagem, o Vale Sagrado ia se estreitando. Lembro-me que Ollantaytambo foi à última cidade antes do grande afunilamento do vale. É mais ou menos nesta região que descem as pessoas que vão fazer a trilha inca. Do trem deu para ver algumas pessoas subindo as grandes montanhas paralelas, rumo ao caminho até Machu Picchu. Como nós havíamos decidido não fazê-lo (desde o Brasil, já que este é um passeio que se marca com MUITA antecedência, pois há limite de pessoas por dia na trilha), seguimos de trem.

Após Ollantaytambo as montanhas aumentam de tamanho e o Vale Sagrado se resume a poucos metros de terra margeando o Urubamba. Nesta hora começam os túneis, único jeito do trem ultrapassar toda aquela quantidade de terra. Foram vários túneis, que indicavam também que estávamos bem próximos do destino final.

Quando deixei o trem, desembarcando na estação de Aguas Calientes, pude perceber bem o ‘buraco de topeira’ onde tínhamos nos enfiado. Toda a região, a cidade, o rio, as ruas, eram envoltos em sombras, por praticamente todo o dia. Isto porque o espaço para todas estas coisas era pequeno e as montanhas eram muito altas. Para ver o cume de qualquer uma destas verdadeiras barreiras, que cercavam todos os lados da cidade, era necessário erguer bem a cabeça. Coisa linda.

Aguas Calientes, também conhecida internacionalmente como Machupicchu Town, não é só a cidade mais perto das ruínas da famosa cidade perdida dos Incas, como possui também uma reserva de águas termais, a estilo de Caldas Novas-GO. Aliás, o próprio nome já diz que estar por lá é poder desfrutar de relaxantes banhos quentes, em um ambiente que geralmente é frio.

Logo na saída da estação encontramos o nosso guia, Javier, nos esperando. Ele nos levou até o nosso hotel, e marcou um horário para a gente almoçar. Não estava com fome, pois o meu estômago ainda me incomodava um pouco, mas, sem comer nada sólido até aquele momento no dia, decidi que deveria tentar comer um pouco.

É bom lembrar que os dois dias de passeio já estavam pagos (as passagens de trem, hotel, refeições, entradas, etc...). Assim, fomos a um restaurante escolhido pelo guia e lá contamos com um almoço ‘pré-pago’. Não sabia o que seria melhor para mim comer, e acabei optando por Lomo Saltado. Só depois que eu percebi o tamanho do meu erro, pois o prato era feito com carne de porco e uma porção significava muita comida. Tomei a sopa de entrada, mas não consegui comer quase nada do prato principal, que voltou quase intacto. Não sabe a dor no coração de fazer isto em meio a uma sociedade tão carente como a andina. Infelizmente, porém, não queria correr risco de um novo problema estomacal no meio do passeio.

Logo depois do almoço partimos para a primeira parte do passeio, que era a visita a Mandor Pampa. É bom explicar que quando eu apresentei este pacote a todo o grupo, ainda no planejamento da viagem, mostrei a todos que ele seria interessante pelo fato de podermos ir um dia antes a Aguas Calientes, dormir por lá, e chegarmos a Machu Picchu de manhã bem cedo. Isto porque quem faz o passeio de um dia até o santuário, sai de Cuzco de manhã e só chega em Machu Picchu perto do meio-dia. Ou seja, o que quero mostrar é que a visita a Mandor Pampa, no primeiro dia, era um mero detalhe.

Até porque descobrimos, no decorrer do passeio, que Mandor Pampa pouco acrescentou em nossas vidas. A região de Aguas Calientes é uma área de transição dos Andes para a floresta Amazônica. Isto se deve a baixa latitude e a altitude que também já não é muito alta (1.800 metros acima do nível mar, apenas um pouco mais que Campos do Jordão-SP). Assim, o passeio de Mandor Pampa é para que turistas, principalmente, do hemisfério norte, que não possuem árvores, plantas e frutas típicas das regiões tropicais. Nenhuma novidade para gente. Tanto que toda vez que o guia nos mostrava uma orquídea ou um mamão papaia, apenas alguns exemplos, a Lucimeire não perdia a oportunidade de contar que ela tinha tudo isto no quintal. Apelidamos, assim, a sua casa de Mandor Pampa.

De qualquer forma, o passeio foi muito cansativo. Tivemos que andar por um caminho estreito, pela linha férrea, com pouco espaço entre os trilhos, o rio e a montanha, no meio de britas e por vários quilômetros. Chegando em Mandor Pampa, que na verdade é o nome da fazenda, ainda fizemos uma trilha pesada para ver uma cachoeira. Pelo tanto que eles falavam dela, parecia uma nova Catarata do Iguaçu, mas, na verdade, eu já tomei banho em cachoeiras maiores. O único detalhe interessante é que sua água era MUITO gelada, pois nada mais é que fruto do derretimento das geleiras dos Andes. Mais à frente, aquele pequeno rio se desemboca no Rio Amazonas.

Quando chegamos de volta a Aguas Calientes, já não agüentava mais. Todo aquele cansaço acumulado, juntamente com os constantes problemas estomacais e uma agenda ainda muito cheia por vir fizeram sentir vontade de voltar para casa o mais rápido possível. Todos estes fatores contribuíram decisivamente para que não sentisse nenhuma expectativa de estar a apenas algumas horas de conhecer Machu Picchu.

Já à noite, fomos até as águas termais para poder relaxar um pouco. Para mim foi maravilhoso ter um momento de sossego. O problema foi sair de uma piscina extremamente quente e ir se trocar no vestiário, a algumas dezenas de metros dali, em meio a um frio de trincar. Partimos dali direto para o hotel, pois precisávamos dormir para o grande dia que, finalmente, havia chegado.

Mapa do Caminho - Dia 16

Data: 19/06/2007
Saída: Cuzco, Peru
Chegada: Aguas Calientes (Machupicchu Town), Peru
Distância percorrida no dia: 112 km
Empresa de ônibus: Peru Rail
Duração da viagem: +- 4h
Tarifa: US$ 35,50

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